2.2. “DIRECTOR” Natureza do cargo:
A existência de um órgão de gestão unipessoal ou colegial não é, em si mesma, uma questão fundamental para a garantia da democraticidade, qualidade e eficácia do exercício das funções de gestão de topo de uma organização. A operacionalidade de um ou outro “modelo” depende de um conjunto diversificado de factores contextuais que tornam descabida uma discussão em abstracto sobre as suas virtualidades. Acresce ainda que a existência formal de um “órgão colegial” nunca impediu a emergência de lideranças individuais e permitiu, em alguns casos, reforçar a emergência de lideranças colectivas. Neste sentido, a solução adoptada no Decreto-Lei 115-A/98 de remeter a decisão sobre as duas modalidades (unipessoal ou colegial) para o regulamento de cada escola parecia-me ajustada 7
É de reconhecer, contudo, que o facto de a quase totalidade das escolas ter optado pela solução “colegial”, leva a pressupor que isso resultou, em muitos casos, de reflexos corporativos ou de um deficiente debate na Assembleia e não, necessariamente, da preocupação de encontrar a solução mais adequada para melhorar o funcionamento da escola. Para obstar ou reduzir estes “efeitos perversos” seria necessário criar condições para qualificar o processo de decisão das assembleias, podendo admitir-se que o ordenamento jurídico determinasse a existência de um “órgão unipessoal” desde que não impedisse, em sede de “contrato de autonomia”, o recurso à “opção colegial”, devidamente fundamentada. O manter esta possibilidade, para além de ser coerente com o reconhecimento de uma autonomia efectiva no domínio organizacional, permitiria desfazer qualquer equívoco quanto a uma eventual intenção de reforço do centralismo e autoritarismo da gestão que os argumentosutilizados no preâmbulo para defender o “director” (como órgão unipessoal) claramente induzem 8 Processo de designação:
- É importante que se tenha mantido a obrigatoriedade de o “director” ser um professor, por razões que me dispenso de aduzir aqui, mas que tenho desenvolvido em muitos textos publicados sobre este assunto. A reafirmação deste princípio faz todo o sentido no quadro da existência de propostas recentes de partidos políticos e movimentos de opinião que visavam a “profissionalização” do gestor escolar e a possibilidade de ele ser seleccionado fora dos quadros docentes. Contudo, a argumentação patente no preâmbulo de que isso se fica a dever, unicamente, ao facto de o “director” assumir a “presidência do Conselho Pedagógico” parece muito frágil e revela alguma falta de convicção em opções políticas mais substantivas (e estas não faltam).- Não se percebe (à falta de uma justificação mais clara) a razão porque se consagra a possibilidade de os docentes do “ensino particular e cooperativo qualificados para o exercício das funções” poderem vir a exercer o cargo de “director” das escolas públicas. No actual estado de separação entre os sistemas público, privado e cooperativo não vejo quais as vantagens que se buscam com este facto, além de que a “experiência na administração e gestão escolar” adquirida por esses professores no seio da sua actividade privada não é directamente transponível para a experiência de directores de escolas públicas.
Na falta de melhor explicitação abre-se o caminho a fundamentações de tipo demagógico que pretendem fazer a analogia entre a pretensa maior qualidade das escolas privadas sobre as escolas públicas, como resultante do mérito dos respectivos gestores e das suas práticas de gestão. Não creio que seja esta a intenção, mas seria importante evitar a confusão.- O projecto de diploma é claro quando afirma no artigo 21º que “O director é eleito pelo Conselho Geral”. Contudo, parece desconfiar da capacidade de juízo e de escolha dos membros do Conselho e introduz um sistema complementar para condicionar o livre juízo dos conselheiros, obrigando a um “procedimento concursal, prévio à eleição” e à criação de uma comissão “especialmente designada para o efeito de elaborar um relatório de avaliação”. Além das dúvidas que podem ser levantadas quanto à legalidade deste procedimento 9 , ele determina uma perversa zona de ambiguidade e um constrangimento absurdo sobre a própria legitimidade que o Conselho tem para proceder, de pleno direito, à eleição do “director”. A experiência do Decreto-Lei 172/91 foi demonstrativa das confusões decorrentes 7 - Esta possibilidade fez parte das minhas propostas no “estudo prévio” referido na nota anterior (Barroso, 1997, p. 68).
8 - As expressões utilizadas no preâmbulo favorecem claramente uma interpretação deste tipo: “Impunha-se, por isso, criar condições para que se afirmem boas lideranças e lideranças fortes, para que em cada escola exista um rosto, um primeiro responsável, dotado da autoridade necessária para desenvolver o projecto educativo da escola e executar localmente as medidas de política educativa. A esse primeiro responsável poderão ser assacadas as responsabilidades pela prestação do serviço público de educação e pela gestão dos recursos públicos postos à sua disposição” (p.3). Convém esclarecer, ainda (como já tive a oportunidade de referir), que no actual normativo nada impede que se afirmem “boas” lideranças, se “prestem contas” e se assumam “responsabilidades”. Portanto, a insistência no argumento de o “órgão unipessoal” permitir “lideranças fortes” e “assacar responsabilidades” não deixa de soar como uma “ameaça” quanto ao tipo de pressão que se pode vir a exercer sobre o “director”.
8 - As expressões utilizadas no preâmbulo favorecem claramente uma interpretação deste tipo: “Impunha-se, por isso, criar condições para que se afirmem boas lideranças e lideranças fortes, para que em cada escola exista um rosto, um primeiro responsável, dotado da autoridade necessária para desenvolver o projecto educativo da escola e executar localmente as medidas de política educativa. A esse primeiro responsável poderão ser assacadas as responsabilidades pela prestação do serviço público de educação e pela gestão dos recursos públicos postos à sua disposição” (p.3). Convém esclarecer, ainda (como já tive a oportunidade de referir), que no actual normativo nada impede que se afirmem “boas” lideranças, se “prestem contas” e se assumam “responsabilidades”. Portanto, a insistência no argumento de o “órgão unipessoal” permitir “lideranças fortes” e “assacar responsabilidades” não deixa de soar como uma “ameaça” quanto ao tipo de pressão que se pode vir a exercer sobre o “director”.
9 - Tendo em conta os fundamentos do acórdão nº 262/2006 do Tribunal Constitucional sobre o Decreto Legislativo Regional nº4/2000/M aprovado pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira.deste sistema híbrido (que visa subordinar a lógica democrática à lógica burocrática) e da inutilidade dos seus propósitos. Por isso, não é de admitir qualquer tibieza quanto à adopção do princípio fundamental da “eleição democrática dos órgãos que asseguram a direcção dos estabelecimentos dos ensinos básicos e secundário” (previsto na Lei de Bases do Sistema Educativo em vigor). Se o argumento subjacente a este “procedimento” é de fomentar uma escolha fundamentada e criteriosa do Conselho, seria suficiente prever, para além da audição dos candidatos pelo plenário do Conselho, a elaboração de pareceres prévios sobre as candidaturas, por um número determinado de membros, incidindo sobre o “curriculum vitae” e o “projecto de gestão”. Quanto ao resto a votação deve ser individual e secreta e não pode existir qualquer constrangimento ao direito dos eleitores escolherem livremente o candidato da sua preferência, em função da confiança que têm no seu mérito para exercerem com competência as funções que lhes estão atribuídas. Este é um princípio elementar da eleição democrática que o “procedimento concursal” nos termos em que é proposto parece querer pôr em causa.
Cessação do mandato: Se as condições previstas nas alíneas a) b) e c) do nº 5 do artigo 26 não oferecem dúvidas, já o preceituado na alínea d) não deixa de causar uma grande perplexidade ao prever a cessação do mandato, a todo o momento, “por despacho fundamentado do membro do governo responsável pela área da educação na sequência de processo de avaliação externa ou de acção inspectiva que comprovem manifesto prejuízo para o serviço público ou manifesta degradação da gestão do agrupamento de escolas ou escola não agrupada”. Por um lado, mais uma vez se instala o clima de desconfiança sobre a capacidade do Conselho exercer as suas funções de “órgão de direcção estratégica responsável pela definição das linhas orientadoras da actividade da escola”. Se, na sequência de uma avaliação externa, o Conselho concluir que é necessário fazer cessar o mandato do “director” já existem os mecanismos previstos na alínea b) para esse efeito.
Se, na sequência de uma acção inspectiva, se verificar que houve incumprimento das obrigações do director, então será aberto um processo disciplinar e actua-se de acordo com o previsto na alínea c). Portanto esta alínea d) além de absurda é inútil, a não ser que se queira fazer da “avaliação externa” uma forma de coacção e um instrumento de punição, desvirtuando assim todo o discurso que vem sendo feito sobre o sentido e finalidade desta avaliação, nomeadamente pela Inspecção-Geral de Educação. Formação:
Reconhece-se como muito positiva a existência de um artigo específico (artigo 29º-1) sobre o direito de o director e os adjuntos terem acesso à formação específica para as suas funções, em termos a regulamentar por despacho do membro do governo respectivo. Contudo, sabendo-se que esta mesma disposição estava igualmente prevista no Decreto-Lei 115-A/98 (onde era referido que ela devia “assumir um carácter prioritário”) e que, dez anos depois, tão pouco se fez nesta matéria, seria de esperar maior precisão.
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