EM SÍNTESE 1. O défice de concretização das medidas de reforço da autonomia dos estabelecimentos públicos da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário que se verifica desde a aprovação do Decreto-Lei 115-A/98 não tem que ver com as eventuais insuficiências deste diploma, mas com a ausência de medidas efectivas a montante e a jusante do processo, nomeadamente no domínio da descentralização municipal, da administração central e desconcentrada do Ministério da Educação e de uma efectiva transferência de competências para as escolas através de contratos de autonomia. 2. A atenção que é dada às questões da gestão (na continuidade aliás do que já acontecia com o actual normativo) reforça o sentido de que os problemas relacionados com a autonomia resultam da deficiência do “modelo” de gestão o que, como se sabe, não é verdade. 3. As principais alterações positivas que foram referenciadas no parecer podiam ser introduzidas como revisão do diploma em vigor sem justificar a sua total substituição. 4. As alterações negativas que foram referenciadas indiciam uma desconfiança tácita quanto ao valor da autonomia (“autonomia sob suspeita”) e quanto à capacidade dos órgãos eleitos democraticamente realizarem cabalmente a sua missão. 5. Os pressupostos presentes no preâmbulo reforçam uma visão normativa da mudança que é completamente desajustada do que se sabe hoje sobre os processos de aprendizagem e de desenvolvimento organizacional. 6. O projecto de diploma não resolve, antes acentua o carácter híbrido e contraditório do discurso em vigor em Portugal, há mais de 10 anos, sobre a autonomia das escolas e que em texto de 2004, caracterizava do seguinte modo: «(…) a autonomia” tem sido uma ficção, na medida em que raramente ultrapassou o discurso político e a sua aplicação esteve sempre longe da concretização efectiva das suas melhores expectativas. Mas ela tem sido uma “ficção necessária” porque é impossível imaginar o funcionamento democrático da organização escolar e a sua adaptação à especificidade dos seus alunos e das suas comunidades de pertença, sem reconhecer às escolas, isto é aos seus actores e aos seus órgãos de governo, uma efectiva capacidade de definirem normas, regras e tomarem decisões próprias, em diferentes domínios políticos, administrativos, financeiros e pedagógicos. Contudo, se adoptarmos uma perspectiva “mais cínica” sobre a natureza e função desta “ficção” no contexto da estratégia política, podemos dizer que, em Portugal (como em outros países), a autonomia das escolas não se limitou a ser uma ficção, tornando-se muitas vezes, uma “mistificação” legal, mais para “legitimar”os objectivos de controlo por parte do governo e da sua administração, do que para “libertar” as escolas e promover a capacidade de decisão dos seus órgãos de gestão. (Barroso, 2004, pp. 49-50)»
Lisboa, 8 de Janeiro de 2008
João Barroso
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