Você pode se chocar com a pobreza de um lugar em que todo mundo parece viver de vender alguma coisa na beira da estrada. Ou você pode admirar a vitalidade e a capacidade de um povo que inventa uma maneira de sobreviver entre os escombros de uma guerra que durou quase os 30 anos da existência do país. No meu caso, depois de quatro dias tentando encarar tudo da maneira mais otimista, de repente me vi caído na mais profunda depressão. Mas daí pedi um pudim de sobremesa e passou. (Lição no. 235: nunca faça regime em países em fase de reconstrução.)
Não há turismo em Angola – os estrangeiros que estão por aqui, aos montes, não vieram a passeio. Se eu ligar para a recepção do hotel e pedir um táxi para ir à praia, a recepcionista vai achar graça. Mas tão logo haja a mínima estrutura (daqui a três, cinco, dez anos?), não tenho dúvida de que os turistas vão começar a aparecer.
A situação de Luanda é belíssima: a cidade fica à beira de uma baía que mais parece uma lagoa, protegida do mar aberto por uma peninsulazinha longa e bastante estreita que o pessoal aqui chama de "Ilha de Luanda". Ao longo da baía corre uma avenida que me lembrou muito o Malecón de Havana, com alguns prédios muito bonitos da época colonial e um forte encarapitado num morro (não há cidade colonial portuguesa sem morro).
A região da Ilha é o playground da cidade, com praias públicas extensas e – preciso deixar claro que a-do-rei isso – pequenas praias particulares, servidas por restaurantes muitíssimo bem montados, freqüentados pela elite angolana e pelos "expatriados", que é como são chamados os gringos (portugas incluídos) por aqui.
Assim como no Brasil, a pobreza é evidente demais – basta sair da região central que a cidade vira um interminável "musseke", o termo kimbundo para favela. Ao contrário de nossas cidades, no entanto, a riqueza (ou a falta de pobreza) se esconde por trás de fachadas decrépitas e muros sem pintura. Deve ser mais ou menos como as ruas: a aparência pode ser lamentável, mas o engarrafamento é de jipões japoneses com ar-condicionado (OK, dividindo o que restou do asfalto com um exército de vans-lotações caindo aos pedaços).
Saindo da beira-mar (onde fica a parte antiga) em direção ao interior, a cidade apresenta um layout muito interessante, com avenidas largas e muitas rotatórias. Embora o socialismo
instaurado com a independência já tenha dado lugar a um capitalismo pragmático, aqui e ali ainda se notam resquícios da era pró-soviética – como as avenidas Lenine e Ho Chi Minh, o cinema Karl Marx e a implicância da polícia com qualquer pessoa de posse de uma câmera fotográfica. Arquitetonicamente, a cidade (assim como aconteceu com Havana, perdoe a insistência) parou na época da revolução – no caso de Angola, em 1975. Se por um lado o Estado nunca teve dinheiro para a manutenção dos prédios residenciais que já existiam, por outro lado também não conseguiu enfear a cidade com a horrorosa arquitetura institucional comunista.
Dificilmente, no entanto, Luanda vai escapar agora da horrorosa arquitetura corporativa capitalista – os arranha-céus vêm aí.
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